Total de visualizações de página

sábado, 3 de setembro de 2011

O FIM DO RAMADÃO


Depois de um mês de sacrifícios, privando o seu corpo e alma das delícias culinárias e da água, do nascer ao pôr do sol diariamente, os muçulmanos celebram a “Koritê”, a festa do fim do jejum.
O Ramadão é um mês difícil e muito pesado espiritualmente. Podemos ver jovens, adultos e até idosos sentados ou deitados em qualquer lugar de sombra nas ruas da cidade, sem forças, com fome e sede, esperando ansiosos que o sol se esconda (aqui o sol se põe em torno de 19 horas) para enfrentar a fila do pão na padaria. Quanto sacrifício os muçulmanos fazem, esperando de Alá o perdão dos seus pecados e a purificação das suas almas. Mesmo crianças maiores são forçadas a jejuar, pois, não se cozinha em casa durante o dia no período de Ramadão. E muitas delas jejuam de verdade. Lembro-me dos meninos no clube de crianças da quarta-feira à tarde recebendo o seu lanchinho, pirolitos ou bolachas, resignados a guardá-los no bolso, enquanto esperam o anoitecer. É incrível a disciplina de vida de muitos muçulmanos, o desejo muitas vezes sincero de se aproximar de Deus, embora seja da maneira errada, biblicamente falando.
O sacrifício do corpo é duro. A sede, especialmente em período de calor, é extremamente grave. O corpo sente a falta da água, dos minerais e nutrientes, pois no suor se vão as forças físicas.
Eu gostaria de ver um dia a igreja de Cristo mais vibrante, jejuando mais, não para ser perdoada, porque o perdão, já o conseguimos na cruz de Cristo, através da nossa confissão e fé no sacrifício d’Ele, mas para buscar mais intimidade com Deus e se colocar na brecha pelas almas que perecem ao redor do mundo. O jejum é uma arma eficaz que Deus colocou à nossa disposição para vencermos muitas lutas espirituais, exemplo disso é a tentação de Cristo no monte, após o batismo, ou o jejum de Saulo, logo após encontrar-se com o Senhor da vida no caminho de Damasco...
Eu gostaria de ver a igreja de Cristo orando mais e se comprometendo mais por Deus. O evangelho ficou tão açucarado, sem vida, sem expressão. Dá tristeza ver os crentes correndo entre mil coisas durante a semana, para virem ao culto do domingo stressados, tentando arrancar das suas almas louvor e adoração a Deus e escutar uma mensagem que possa sustentá-los para a próxima semana que certamente será mais corrida que a anterior... Pouca gente tem realmente tempo de buscar a Deus, pouquíssima gente vai às reuniões de oração, e raríssima gente ainda jejua regularmente... Onde vamos parar?
Assim, não é por acaso que hoje vejamos muitas igrejas sem vida, sem ver milagres, sem avivamento, sem sede de Deus, sem compromisso e ânimo nos programas e trabalhos espirituais... O sacrifício de vida já não tem tanto valor como tinha no tempo dos grandes homens de Deus como Wesley, Study e outros... Missões viraram assunto ocasional, pois à maioria das igrejas podem passar uma década sem enviar um único missionário membro da igreja aos campos transculturais, lá onde o evangelho não foi ainda pregado...
Algumas igrejas têm adoecido da doença do humanismo, do culto ao corpo, do culto à intelectualidade, do culto à agenda de festas e eventos. Algumas igrejas estão doentes, muito doentes. Elas precisam do Noivo para curá-las, mas seu espírito de independência as afastou do Noivo, única fonte de amor, perdão e restauração possível para elas...
Senhor, eu clamo hoje que nós como Igreja vivamos de novo, que voltemos a ter sede de ganhar almas para o Senhor, que voltemos a ter sede pela oração e busca de Deus, que nos animemos para o trabalho do Senhor, a retomada dos cargos e funções no Corpo, as programações, o cuidado dos nossos pastores e as famílias; que vibremos por tempos de comunhão, de ficar juntos aos pés do Senhor... Que esqueçamos a comida das festas, e façamos mais festas espirituais de oração, louvor e Palavra... Que saiamos das quatro paredes e possamos ir em direção às almas que estão nos hospitais, nas prisões, nas ruas, em casa... milhares caminhando para a perdição e precisando de alguém que as tire do caminho da morte... Que sejamos mais fiéis ao Senhor, e corramos menos atrás do vento e das coisas vãs desta vida... Que corramos de volta para os braços do Noivo.
Que nos despertemos do sono e nos levantemos de novo para Deus! Que sejamos exemplos de vida espiritual para a cidade, exemplos de fé, exemplos de busca e consagração, exemplos de obediência à Palavra e exemplos de como fazer Missões. Que como Igreja-Noiva de Cristo nos voltemos de todo o coração para Cristo, nosso Noivo, e continuemos nos preparando para o dia das Bodas no céu.
Tudo o mais não tem sentido. A vida passa. A velhice chega rápido. As doenças chegam. Os amados se vão. Os amigos vão para longe. A família se espalha. Os filhos crescem e partem de casa. A solidão chega de mansinho para nos acompanhar definitivamente na velhice...
Só Deus permanece para sempre. Só ELE é o verdadeiro sentido de viver e existir. ELE é a RAZÃO MAIOR, e a única suficiente para continuarmos a VIDA ABUNDANTE que Ele nos prometeu. SÓ ELE. MAIS NINGUÉM. MAIS NADA. O resto é vaidade e correr atrás do vento.
Vildene Almeida Lopes Ndecky
Terça, 30 de agosto de 2011 - Dakar, Senegal

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A TENDA MISSIONÁRIA

            O apóstolo Paulo era um fazedor de tendas. Ele conhecia todos os seus detalhes, e especialmente a sua fragilidade. A tenda é um categoria de habitação muito particular e provisória, relativamente barata e sem valor durável. Ela envelhece rapidamente, rasga-se facilmente, deve ser fincada com ganchos e ferros na terra de maneira profunda, para que resista aos ventos fortes. A tenda é a habitação dos nômades, daqueles que não têm morada duradoura em lugar algum. A tenda não bloqueia nem o calor, nem o frio demasiados. Ela protege um pouco e por um tempo alguém que está ao ar livre, sujeito a todas as intempéries da natureza. Em resumo, a tenda é uma habitação frágil e sem grande durabilidade.
            A Bíblia compara o nosso corpo a uma tenda (2 Cor 5:1-2). E Paulo diz que mesmo que a nossa tenda seja destruída, nós temos uma habitação eterna, sólida (e eu acrescento maravilhosa) no céu. Esta é a nossa segurança de vida eterna com Cristo.
            O nosso corpo é extremamente frágil e delicado. Eu sou técnica em enfermagem e tenho visto na prática a sensibilidade e a delicadeza da vida humana. A Bíblia a compara inclusive a uma erva, a uma flor da erva que hoje nasce e amanhã murcha e cai (Is 40;7,8). A vida é tão breve!
            Os hospitais estão lotados de pessoas sofrendo ao redor do mundo inteiro. Imaginemos os milhões de cancerosos, aidéticos, doentes cardíacos, neurológicos, renais e gastro-intestinais, sem falar dos atingidos pelas doenças epidêmicas que matam milhares por ano, tais quais a tuberculose, o paludismo, a meningite, o cólera, a dengue e agora nos últimos anos as gripes aviária e suína. Quantas vidas sofrendo e quantas mortes por dia neste planeta! Eu não posso começar a minha rotina pela manhã ao acordar-me sem antes orar por todos aqueles que estão nos leitos dos hospitais ou nas suas casas ao redor do mundo, sofrendo física, emocional ou espiritualmente; sem orar pelos enlutados, abandonados, desprezados, mal-amados, rejeitados e infelizes. É ali que agradeço a Deus imensamente pela graça que Ele me dá de estar em pé cada manhã e poder sair para o trabalho e viver uma vida normal, apesar dos pequeninos problemas que enfrentamos na nossa jornada diária.
Enfim vemos que as nossas pequenas mazelas tornam-se infinitamente minúsculas diante de sofrimentos maiores que existem no nosso planeta. Pensemos nas pediatrias dos hospitais, falemos com mães cujas criancinhas inocentes sofrem de doenças congênitas e graves, e devem passar um terço das suas vidas internadas. Visitemos os enfermos nos hospitais. O hospital é uma excelente escola onde se aprende a humildade, a dependência de Deus e os verdadeiros valores da existência humana. Ali tudo que é fútil se desvanece. Eu tive o privilégio de conhecer uma menininha com problema cardíaco congênito num hospital. Ela passava a maioria do tempo internada e a sua mãe carregava marcas profundas no rosto e no coração, devido às noites mal dormidas numa cadeira sem conforto, ao lado do leito da filha. Um sofrimento sem fim...
            Ah! Como a nossa tenda é frágil! E mais a idade avança mais a tenda se desgasta, começa a rasgar-se, a ser destruída pouco a pouco; é um rasguinho aqui, outro ali, até o dia em que ela se rompe completamente e se acaba.
            A obra missionária carrega toda essa fragilidade, porque ela é feita por vidas humanas cujos corpos não passam de “tendas”. E quando olho para a minha vida e a dos colegas de campo que são ocasionalmente surpreendidos por problemas de saúde, que têm que enfrentar a saída do campo para tratamento médico, e outros até que têm que viver no campo com diabetes, problemas renais, gastro-intestinais, cardíacos e outros... Sim, olhando para nossa vida, vemos o quanto somos frágeis e sem forças. Missionário não é super-homem.
            Mas o Dono da tenda é forte, é rico, é poderoso. O Dono da tenda é Deus. De fato, Ele construíra originalmente a sua primeira  tenda (Adão) sólida, eterna e incorruptível. Mas a "tenda" decidiu diferentemente e arrastou todo o lote de fabricação à fragilidade e à destruição.
            Assim, a nossa tenda tornou-se vulnerável e defeituosa, mas o Dono, o nosso querido Deus nos deu a esperança de que a alma que mora dentro dela ( o nosso verdadeiro ser) não se perderia se escolhesse se entregar a Deus e viver neste mundo conforme a Sua vontade. Ele, na Sua misericórdia, nos preparou um edifício sólido e incorruptível no céu, construído sobre ruas de ouro. E Deus, o Dono da tenda, nos promete na Sua Palavra que, mesmo que a nossa tenda seja destruída, a nossa alma tem morada segura no céu, morada sólida e eterna na cidade do Rei Jesus. A morte para o cristão genuíno não passa de uma mudança de habitação e de lugar: da terra para o céu; da tenda para o edifício sólido e incorruptível construído pelas mãos divinas.

O nosso Salvador Jesus Cristo salvou a alma dentro da tenda, e pelo Seu poder, pode até restaurar a tenda que se estraga, fazendo milagres maravilhosos e extraordinários de cura conforme o Seu querer e a fé do pedinte.
                        A obra missionária certamente continuará a carregar fragilidade e muitas limitações. Oremos sem cessar para que o Senhor da seara continue a enviar novas tendas para reciclar as que vão se rasgando e se desfazendo, cujas almas gemem a esperar a Redenção, o dia do encontro com Cristo, onde a dor e o sofrimento já não existirão.

Vildene Almeida Lopes Ndecky
Dakar, 27 de Julho de 2009, segunda pela manhã.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

02 de Abril de 2011 - 30 anos andando com Deus

Nesse 2 de abril comemorei o meu aniversário dos trinta anos de fé, andando com Jesus.
Lembro-me de tantos momentos especiais...
Aquele dia numa reunião de senhoras, quinta-feira pela manhã, em Itapetinga-BA, Sandra Silva Chaves, uma colega e amiga da escola que se tornou a minha mãe na fé, veio me buscar no hotel onde morava. E eu por delicadeza fui com ela.
A reunião liderada pela missionária Ioná foi tremenda, com muito quebrantamento e o operar de Deus. Não resisti ao apelo, e entreguei-me totalmente a Ele, o Senhor Jesus...
Tudo mudou em seguida. Foi o tempo de primeiro amor, tempo maravilhoso... Quinze dias depois, num grande encontro regional de igrejas em Nova Canaã, cidade do interior da Bahia, ouvi o chamado irresistível de Deus para Missões. Disse sim para o Senhor da Seara: “Eis-me aqui, envia-me a mim!” A Igreja Batista Calvário me acolheu com carinho, e o Pr. Eliakim impactou-me profundamente com a Palavra, com o seu testemunho de Cristo e sobretudo com a sua vida de oração. A sua voz ecoa ainda na minha alma: "Sei que nada mereço de Ti, sei que nada faço, só entristeço a Ti..." Que belas canções cantava! Ali fui alimentada e cresci na fé, acolhida com muito carinho pela família Chaves.
Dois anos depois, tendo terminado o segundo grau, voltei para Potiraguá, minha cidade natal, onde trabalhei vários anos como professora primária e como missionária sem título na Igreja Batista. O Pr. Nelson e a irmã Elza, sua esposa, foram exemplos de vida com Deus, de simplicidade, de humildade e de doçura. O meu querido pastor me ensinou a caminhar com Deus com muita simplicidade, humildade e o temor do Senhor.
Ali me fortaleci na visão missionária, buscando em seguida ir para o seminário, mas obediente ao meu pai, permaneci em casa, pois na sua compreensão, filha mulher só sairia de casa casada. E eu disse para Deus que, por respeito e obediência ao meu pai e ao quarto mandamento, eu ficaria em casa até que o Senhor quebrantasse o seu coração para me liberar para Missões. Foram anos de oração até o dia em que o Senhor fez esse milagre no coração do meu pai. 
Assim, parti da Bahia para o Paraná estudar por quatro anos num seminário teológico da missão Betânia em Altônia-PR, acompanhada de dois outros jovens da igreja.
Ali a visão da África tornou-se gradualmente mais clara. O amor pela África aumentou. O meu coração se abrasou. Estava disposta a tudo para que Deus me enviasse para Missões.
Terminando o seminário, fui para Rio Verde-GO fazer um curso de enfermagem no Hospital Evangélico, que oferecia bolsa de estudos, alojamento e refeições para missionários. Foi um tempo abençoado de estudos, estágio e sobretudo de evangelismo no hospital.  Ao final do meu curso de enfermagem ali, pedi a minha transferência da Igreja Batista à Segunda Igreja Presbiteriana, onde fui acolhida com muito amor e carinho pela nova igreja que o Senhor me deu. Em breve me enviariam para o meu primeiro campo transcultural.
Então Deus me chamou para um novo desafio: Servir numa região do Paraguai onde não havia médico. Foi um tempo muito especial, onde aprendi a servir a Deus numa outra cultura e uma nova língua, o espanhol, trabalhando como técnica em enfermagem e missionária numa região carente. Durante aquele tempo, levei o Senhor Jesus a muitos lares paraguaios, evangelizando e cuidando dos doentes...
De volta ao Brasil, enfrentei os últimos desafios antes de vir definitivamente para o Senegal: Fazer curso de Linguística, levantar sustento e fazer um curso de inglês. Fui morar em Brasília e ali aprendi mais com Deus sobre as tribos não-alcançadas na Missão Além. Em seguida fui para Minas fazer um curso de Inglês na Missão Amém.
Nesse ínterim, o meu pai se enfermou gravemente do coração e veio a óbito em S. Paulo, um mês antes de eu partir para o campo missionário africano. Foi um momento duro e uma prova muito difícil, pois Deus me pediu para quebrar o vaso de perfume mais precioso (simbolizando o meu querido pai) aos Seus pés antes de partir para Missões. Eu o fiz com pesar, mas confiando no Senhor. 
Em seguida o tempo da viagem para o Senegal chegou, em outubro de 1995. Seria a minha primeira viagem de avião. Estava tão insegura, com o coração na mão... Como na época, não se podia pegar visto para o Senegal no Brasil, tive que pegar visto para Cabo Verde primeiro, viajando primeiro para a Ilha do Sal, e em seguida para Formosa, de onde finalmente poderia conseguir visto para o Senegal: uma verdadeira aventura! Três aviões para conseguir chegar, e uma viagem que durou quase uma semana.
Enfim, cheguei em Dakar, capital do Senegal. E aqui estou a servir ao Senhor nos últimos quinze anos, para a glória do Seu nome, sempre caminhando com Ele... nas lutas... nas provas... nas enfermidades... solteira... casada... com filhos... em todas as situações, de calma e de perseguição, de alegrias, de perda de familiares..., mas sempre andando com Ele, o Senhor Jesus.
Ele é tão maravilhoso, tão fiel, tão bom para comigo...
Ele é imensamente generoso, o Amigo de todas as horas...
Ele é e sempre será a Única Razão da minha existência...
Ele que me tem ensinado lições de vida preciosas...
Ele que tem provido, que nunca me tem abandonado...
Ele que me deu o privilégio de nascer na família Lopes, de ter pais e irmãos tão especiais...
Ele que me tirou da solidão na África, e me deu uma família tão linda, um marido incrível e filhos que são presentes de Deus...
Ele que me coroou de irmãos e amigos preciosos na fé...
Ele que me deu uma igreja tão maravilhosa da qual sou membro e missionária, como também outras igrejas e irmãos tão queridos que têm orado por mim e apoiado financeiramente a minha família ao longo dos anos com tanta fidelidade...
Ele... Ele... Ele... Ele é TUDO para mim!
Glórias sejam dadas a Ele por esses trinta anos de fé cristã e de felicidade!

Dakar, Senegal
04 de Abril de 2011